quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Brasil Coração do Mundo Pátria do Evangelho - A Guerra do Paraguai

Pelo Espirito de Humberto de Campos
Psicografia Francisco Cândido Xavier


O segundo reinado, depois das angustiosas expectativas do período revolucionário, atravessava uma época de paz, em que se consolidavam as suas conquistas no terreno da ordem e da liberdade.

D. Pedro II, à medida que ia ampliando o patrimônio das suas experiências em contato com a vida e com os homens, amadurecia, cada vez mais, as belas qualidades do seu coração e da sua inteligência. Suas virtudes morais granjearam para a sua personalidade mais que a simpatia popular, pois o generoso imperador, de cuja dotação se beneficiavam tantos pobres e se educavam inúmeros estudiosos sem recursos, vivia aureolado pela veneração carinhosa das multidões. Dado à arte e à filosofia, sua notoriedade, nesse sentido, alcançou os próprios ambientes da cultura europeia, onde seu nome se impunha à admiração de todos os pensadores do século.

No problema constitucional, todavia, o imperador muitas vezes se abstraía dos textos legais para consultar os interesses gerais da nação, norteando-se muito mais pela imprensa que pela opinião pessoal dos seus ministros, o que desgostava profundamente os políticos da época, que encaravam essas atitudes como impertinências do monarca republicano da América, afigurando-se-lhes que ele se deixava atrair pelas resoluções ilegais. A verdade, contudo, é que o Brasil nunca atravessou um período de tamanha liberdade de opinião. Somente as nacionalidades de origem saxônia gozavam, a esse tempo, no planeta, da mesma independência e das mesmas liberdades públicas. Numerosas conquistas, nesse particular, se consolidaram sob a administração do imperador generoso e liberalíssimo. Em 1850 iniciava-se a plena supressão do tráfico negro, realizando-se a abolição, por etapas altamente significativas. Em 1843, Dom Pedro II desposara D. Teresa Cristina Maria, princesa das Duas Sicílias, que viria partilhar com ele, no sagrado instituto da família, da mesma abnegação e amor pelo bem do Brasil.

No mundo invisível, as falanges de Ismael não se descuravam da Pátria do Evangelho, enviando para a administração do segundo reinado os elevados Espíritos que seriam colaboradores do grande imperador na solução dos relevantes problemas da abolição, da economia e da liberdade. Foi assim que, naquela época de organização da pátria, apareceram homens e artistas extraordinários, como Rio Branco e Mauá, Castro Alves e Pedro Américo, que vinham com elevada missão ideológica, nos quadros da evolução política e social da Pátria do Cruzeiro.

O homem, porém, terá de constituir o patrimônio do seu progresso e iluminar o caminho da sua redenção à custa dos próprios esforços e sacrifícios, na senda pedregosa da experiência individual. Ora, em meio dessas lutas, o poder moderador da Coroa não conseguiu eliminar certo fundo de vaidade, que se foi estratificando na alma nacional, fazendo-lhe sentir a sua supremacia sobre as demais nações americanas do Sul. Dentro dessas ideias perigosas da vaidade coletiva, sentia-se o Brasil, erradamente, com o direito de interferir nos negócios dos Estados vizinhos, em benefício dos nossos interesses. É verdade que os países de colonização espanhola sempre tratavam o Brasil com mal disfarçada hostilidade, desejando reviver no Novo Mundo os antagonismos raciais da velha península; não competia, porém, à política brasileira exorbitar das suas funções, no intuito de assumir a direção da casa dos seus vizinhos.

De 1849 a 1852, o Brasil interferiu nas questões da Argentina e do Uruguai, contra a influência de Rosas e Oribe. O caudilho Ortiz de Rosas trazia a civilização platina sob um regime de crueldade e tirania; diversas vezes provocara o Brasil com o seu ânimo despótico, que chegou a fazer no Prata mais de vinte mil vítimas e, irrefletidamente, o Império prestigiou a Urquiza, outro caudilho, que governava Entre-Rios, a fim de eliminar o tirano. Pela influência dos seus militares mais dignos, as tropas brasileiras depuseram Oribe e no combate de Monte Caseros destruíram para sempre a influência do déspota, que humilhava Buenos Aires. Enquanto as bandeiras do Brasil regressam triunfantes com o Conde de Porto Alegre e o povo festeja a vitória das suas armas, os países da América do Sul olham desconfiadamente para a supremacia arrogante da política brasileira, no propósito de se colocarem a salvo das suas indébitas intervenções.

Após uma das festas que comemoravam os acontecimentos, D. Pedro II se retira silenciosamente para o recanto do seu oratório particular. Com o espírito em prece, contempla o Crucificado, cuja imagem parece fitá-lo cheia de piedade e doçura. Nas asas brandas do sono, o grande imperador é então conduzido a uma esfera de beleza esplêndida e inenarrável. Parece-lhe conhecer as disposições particulares daquele sítio de doces encantamentos. Aos seus olhos atônitos surge, então, o Divino Mestre, que lhe fala como nos maravilhosos dias da ressurreição, após os martírios indizíveis do Calvário, assinalando as suas palavras com sublime brandura:

— Pedro, guarda a tua espada na bainha, pois quem com ferro fere com ferro será ferido. A tua indecisão e a tua incerteza lançaram a Pátria do Evangelho numa sinistra aventura. As nações, como os indivíduos, têm a sua missão determinada e não é justo sejam coagidas no terreno das suas liberdades. O lamentável precedente da invasão efetuada pelo Brasil no Uruguai terá dolorosa repercussão para a sua vida política. Não descanses sobre os louros da vitória, porque o céu está cheio de nuvens e deves fortificar o coração para as tempestades amargas que hão de vir. Auxiliarei a tua ação, através dos mensageiros de Ismael, que se conservam vigilantes no desenvolvimento dos trabalhos sob a tua responsabilidade no país do Cruzeiro; mas, que as tristes provações gerais, em perspectiva, sejam guardadas como lição inesquecível e como roteiro de experiência proveitosa para as tuas atividades no trono.

D. Pedro II, depois daquele sono curto, na intimidade do oratório, sono preparado pelas forças invisíveis que o rodeavam, recolheu-se ao leito, cheio de angústia e de ansiosa expectativa.

Os anos não tardaram a confirmar as advertências do Senhor, que é a luz misericordiosa do mundo. Em 1865, quando o Brasil procurava interferir novamente nos negócios do Uruguai, impondo a sua vontade em Montevidéu, o Paraguai se sentiu ameaçado na sua segurança e se declarou contra o Brasil, ferindo-se então a guerra que durou cinco longos anos de martírios e derrames de sangue fraterno.

O Paraguai, como os outros países vizinhos, vivia reduzido à condição de feudo militar. A lei marcial imperava ali sistematicamente e Solano López não receou arrastar o seu povo àquela terrível aventura. Sua personalidade, como político, não era inferior à dos caudilhos do tempo e grandes valores poderiam ser incorporados às suas tradições de chefe, muitas vezes apresentado como tirano cheio de crueldades nefandas, se os frequentes desastres das armas paraguaias e os triunfos do Brasil não acabassem por desorientá-lo inteiramente, levando-o a queimar o último cartucho da sua amargurada desesperação e a perder a posição nobre que a História indubitavelmente lhe reservaria.

Aliando-se aos seus amigos da Argentina e do Uruguai, o Brasil afirmou, com a vitória, a sua soberania. O próprio imperador visitou o campo de operações bélicas em Uruguaiana, onde assistiu à rendição de seis mil inimigos. Os militares brasileiros ilustram o nome da sua terra em gloriosos feitos, que ficaram inesquecíveis. Mas, o país do Evangelho sempre foi infenso às glórias sanguinolentas. Estero Belaco, Curupaiti, Lomas Valentinas, Tuiuti, Curuzu, Itororó, Riachuelo e tantos outros teatros de luta e de triunfo, em verdade não passaram de etapas dolorosas de uma provação coletiva, que o povo brasileiro jamais poderá esquecer.

A realidade, entretanto, é que o Brasil retirou desse patrimônio de experiências os mais altos benefícios para a sua política externa e para a sua vida organizada, sem exigir um vintém dos proventos de suas vitórias. A diplomacia brasileira encarou de mais perto o arbítrio inviolável dos países vizinhos e uma nova tradição de respeito consolidou-se na administração da terra do Cruzeiro. Nunca mais o Brasil praticou uma intervenção indevida, trazendo em testemunho da nossa afirmativa a primorosa organização da nacionalidade argentina que, apesar da inferioridade da sua posição territorial, comparada com a extensão do Brasil, é hoje um dos países mais prósperos e um dos núcleos mais importantes da civilização americana em face do mundo.

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