sábado, 15 de outubro de 2016

Brasil Coração do Mundo Pátria do Evangelho - A Inconfidência Mineira

Pelo Espirito de Humberto de Campos
Psicografia Francisco Cândido Xavier

A Inconfidencia Mineira

Por morte de D. José, ascendeu ao trono sua filha, D. Maria I, a Piedosa, a cuja autoridade ficariam afetas as grandes responsabilidades do trono, naquela época em que um sopro de vida nova modificava todas as disposições políticas e sociais do Velho Mundo. 

No seu reinado, Portugal sente esvaírem-selhe as forças poderosas e se encaminha com rapidez para a decadência e para a ruína. Não fossem as notáveis influências de um Martinho de Melo ou de um Duque de Lafões, talvez fosse ainda mais desastroso o reinado de D. Maria, escravizada ao fanatismo do tempo e às opiniões dos seus confessores.

Por esse tempo, o Brasil sofria o máximo de vexames, no que se referia ao problema da sua liberdade. A capitania de Minas Gerais, que se criara e desenvolvera sob a carinhosa atenção dos paulistas, era então o maior centro de riquezas da colônia, com as suas minas inesgotáveis de ouro e diamantes. A sede de tesouros edificara Vila Rica nos cumes enevoados e frios das montanhas, reunindo-se ali uma plêiade de poetas e escritores que sentiriam, de mais perto, as humilhações infligidas pela metrópole portuguesa à pátria que nascia. A verdade é que em Minas se sentia, mais que em toda parte, o despotismo e a tirania. O clero, a magistratura e o fisco, juntos aos ambiciosos que aí se estabeleceram, apossavam-se de todas as possibilidades econômicas, presas de criminosa ânsia de fortuna. Os padres queriam todo o ouro das minas, para a edificação das suas igrejas suntuosas; os membros da magistratura consideravam de necessidade enriquecer-se, antes de regressarem a Portugal, com opulentas aquisições; os agentes do fisco executavam as determinações da corte de Lisboa, árvore farta e maravilhosa, onde todos os parasitas da nobreza iam sugar a seiva de pensões extraordinárias e fabulosas.

Eram então numerosos na Europa os estudantes brasileiros, os quais de lá voltavam ao país saturados dos princípios filosóficos de Rousseau e dos enciclopedistas. A independência da América do Norte e a constituição democrática de Filadélfia animam aqueles Espíritos, insulados nas montanhas distantes. Por toda a capitania mais rica da colônia, desdobram-se quadros dolorosos da miséria do povo, esmagado pelos impostos de toda natureza. As coletividades de trabalhadores, conduzidas à ruína pelo malogro das minerações, não conseguiriam suportar por mais tempo semelhantes vexames.
Em Minas, porém, uma elite de brasileiros considera a gravidade da situação. Intelectuais distintos se sentem compenetrados da maioridade da pátria, que, ao seu ver, poderia tomar as rédeas dos seus próprios destinos.

Iniciam-se os esboços da conspiração. Depois de algumas conversações em Vila Rica, das quais, entre muitos outros, participaram Inácio de Alvarenga, Joaquim José da Silva Xavier, Cláudio Manuel da Costa e Tomás Gonzaga, conversações em que foram adotadas as primeiras providências, a infiltração das ideias libertárias começou a fazer-se através de todos os elementos da capitania, no que ela possuía de mais representativo. José Joaquim da Maia é enviado à Europa para sondar o pensamento de Jefferson14, embaixador da América do Norte em Paris, e angariar a simpatia dos brasileiros espalhados no Velho Mundo, para o movimento libertador. Outros estudantes, apaixonados pela emancipação da colônia, os conspiradores mandam a S. Paulo e a Pernambuco, que formavam os dois centros mais importantes do país, com o objetivo de conquistar a adesão de ambos ao movimento. Todavia, nem Joaquim da Maia conseguiu o auxílio de Jefferson, que apenas chegou a se interessar moralmente pelo projeto, nem os seus companheiros obtiveram o compromisso formal das capitanias mencionadas, para se articular o movimento revolucionário. Pernambuco estava refazendo as suas economias, depois das lutas penosas de Recife e Olinda, e São Paulo se encontrava desiludido, depois da guerra dos emboabas, na qual, muitas vezes, fora vítima da felonia e da traição. A conjuração de Minas, contudo, prossegue na propaganda, sem esmorecimentos.

Embriagados pela concepção da liberdade política, mas, dentro dos seus triunfes literários, afastados das realidades práticas da vida comum, os intelectuais mineiros não descansaram. Idealizaram a república, organizaram seus símbolos, multiplicaram prosélitos das suas ideias de liberdade; porém, no momento psicológico da ação, os delatores, a cuja frente se encontrava a personalidade de Silvério dos Reis, português de Leiria, levaram todo o plano ao Visconde de Barbacena, então Governador de Minas Gerais. O governador age com prudência, a fim de sufocar a rebelião nas suas origens, e, expedindo informes para que o Vice-Rei Luís de Vasconcelos efetuasse a prisão do Tiradentes no Rio de Janeiro, prende todos os elementos da conspiração em  Vila Rica, depois de avisar secretamente aos seus amigos do peito, simpatizantes da conjuração, quanto à adoção de tais providências, para que não fossem igualmente implicados.

Aberta a devassa e terminado o vagaroso processo, são condenados à morte todos os chefes já presos.

Os historiadores falam do grande pavor daqueles onze homens que se ajuntavam, andrajosos e desesperados, na sala do Oratório, para ouvirem a sentença da sua condenação, após três longos anos de separação, em que haviam ficado incomunicáveis nos diversos presídios da época. A leitura da peça condenatória, pelo desembargador Francisco Alves da Rocha, levou quase duas horas. Depois de conhecerem os seus termos, os infelizes conjurados passaram às mais dolorosas e recíprocas recriminações. Os mais tristes quadros de fraqueza moral se patenteavam naqueles corações desiludidos e desamparados; mas, no dia seguinte, a dura sentença era modificada. D. Maria I havia comutado anteriormente as penas de morte em perpétuo degredo nas desoladas regiões africanas, com exceção do Tiradentes, que teria de morrer na forca, conservando-se o cadáver insepulto e esquartejado, para escarmento de quantos urdissem novas traições à coroa portuguesa.

O mártir da inconfidência, depois de haver apreciado, angustiadamente, a defecção dos companheiros, reveste-se de supremo heroísmo. Seu coração sente uma alegria sincera pela expiação cruel que somente a ele fora reservada, já que seus irmãos de ideal continuariam na posse do sagrado tesouro da vida. As falanges de Ismael lhe cercam a alma leal e forte, inundando-a de santas consolações.

Tiradentes entrega o Espírito a Deus, nos suplícios da forca, a 21 de abril de 1792. Um arrepio de aflitiva ansiedade percorre a multidão, no instante em que o seu corpo balança, pendente das traves do cadafalso, no Campo da Lampadosa. 

Mas, nesse momento, Ismael recebia em seus braços carinhosos e fraternais a alma edificada do mártir.

— Irmão querido — exclama ele —, resgatas hoje os delitos cruéis que cometeste quando te ocupavas do nefando mister de inquisidor, nos tempos passados. Redimiste o pretérito obscuro e criminoso, com as lágrimas do teu sacrifício em favor da Pátria do Evangelho de Jesus. Passaras a ser um símbolo para a posteridade, com o teu heroísmo resignado nos sofrimentos purificadores. Qual novo gênio surges, para espargir bênçãos sobre a terra do Cruzeiro, em todos os séculos do seu futuro. Regozija-te no Senhor pelo desfecho dos teus sonhos de liberdade, porque cada um será justiçado de acordo com as suas obras. Se o Brasil se aproxima da sua maioridade como nação, ao influxo do amor divino, será o próprio Portugal quem virá trazer, até ele, todos os elementos da sua emancipação política, sem o êxito incerto das revoluções feitas à custa do sangue fraterno, para multiplicar os órfãos e as viúvas na face sombria da Terra...

Um sulco luminoso desenhou-se nos espaços, à passagem das gloriosas entidades que vieram acompanhar o Espírito iluminado do mártir, que não chegou a contemplar o hediondo espetáculo do esquartejamento.

Daí a alguns dias, a piedosa rainha portuguesa enlouquecia, ferida de morte na sua consciência pelos remorsos pungentes que a dilaceravam e, consoante as profecias de Ismael, daí a alguns anos era o próprio Portugal que vinha trazer, com D. João VI, a independência do Brasil, sem o êxito incerto das revoluções fratricidas, cujos resultados invariáveis são sempre a multiplicação dos sofrimentos das criaturas, dilaceradas pelas provações e pelas dores, entre as pesadas sombras da vida terrestre.

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